Pesquisar este blog

sábado, 15 de outubro de 2011

PROFESSOR...

Tem alguém aí que quer ser professor? Levante a mão, por favor!” Fiz a pergunta-solicitação e calei. Corri o olho no auditório. Ninguém. Uns se olharam, outros me olharam, outros fixaram o olho no branco do fundo da tela onde deveria haver um PowerPoint. A platéia, claro, não era de alunos de Pedagogia. Era uma galerinha bonitinha, com umas branquinhas gostosas com cabelinhos enrolados, dreadlocks classe média, cheias de discursos. Falaram tantas vezes que o problema da educação é do professor. Alunos de Pedagogia, se havia, se calaram. Até porque a maioria deles quer fazer qualquer outra coisa, menos assumir a sala de aula. Menos ser professor.

Calei! Na verdade quase ninguém quer acordo com sala de aula. A verdade é esta. Mas todo mundo quer meter o pau no professor e na escola. Ou então os professores que existem, estão alienados com esse negócio de sacerdócio, de tia, de amor, dessa perfumaria barata. Pensei: nisso aí temos culpa sim! Podíamos organizar uma insurgência. Devolver à sociedade a responsabilidade pela educação. Declarar: a partir de hoje não queremos mais educar não! Queremos somente dar nossas aulas, recebendo por elas o devido preço justo. A responsabilidade pela educação, nós devolvemos aos pais e mães – que se demitiram do compromisso e da responsabilidade de educar seus filhos. Devolvemos a responsabilidade de educar à mídia – habituada a estandardizar o desastre e a tirar proveito da miséria humana, cada vez mais espetacularizada. Devolvemos a responsabilidade de educar à rua – vampirizada por todos os ímpetos mercantis, especialmente pelos vampiros do entretenimento fútil.

Olhei mais uma vez aquela platéia bonitinha, com o discursozinho organizado, o dedo em riste, apontando para o professor e para a escola. Garotos e garotas cheios das mais novíssimas teorias sobre o nada do nada, sobre como mudar o mundo a partir dos seus perfis no Facebook, achando que a revolução é esta e não há outra. Pensei mais uma vez: a partir de hoje deixaremos o compromisso de educar aos alunos bonitinhos desses cursos das artes e profissões liberais, nicho da classe média intelectualizada. Gente inteligente e bonita, liberal e doida, chegada a uma psicodelia. Deixemos a essa gente boa! Deixemos aos porta-malas dos carros dos novos ricos, eles próprios deseducados, com grana e sem glamour. Deixemos aos jovens, cujos pais ajudaram a escolher a profissão, mas seguramente os aconselharam a não escolher a profissão docente. Deixemos a eles que escolherem uma profissão mais nobre, falando pragmaticamente: que dá dinheiro rápido, para que comprem, já no primeiro ano de consultório ou de escritório, o Honda Civic do ano, para pousarem de quase-Deus.

Deixemos o compromisso de educar ao advogado neófito, preso à linguagem da burocracia jurídica; ao doutorzinho de branco, receitando com programa de computador; ao empresário, que ganha dinheiro vendendo porcaria; ao jornalista, achando que, porque sentou na mesma poltrona que o deputado, já lhe é íntimo; ao político, querendo sempre transformar tudo em voto e caixa dois, o que vier primeiro. Deixemos a eles. São eles, todos eles, esses e outros, pessoas de bem, tão preocupadíssimas com a educação, que de hoje em diante devem educar. Aliás, são eles que, a partir de hoje, devem assumir que educam, devem assumir que também são responsáveis pelas subjetividades doentes que a escola recebe para tratar. A escola: “clínica do social”. Chega disso!

Achei estranho que ninguém queira ser professor. Que todos os que dizem que a educação é uma coisa muito importante, não queiram negócio com ela. Que todos os que dizem que professor é o profissional mais importante da galáxia, não queiram sê-lo. Achei estranho que naquela platéia, com tantas pessoas ávidas a apontar o dedo na cara do professor, não houvesse nela ninguém querendo ocupar este lugar da docência. Sintomático!

Então podem mandar suspender aquela propaganda do "Todos Pela Educação" na Televisão, que ela não está dando resultados!

Minha síntese: enquanto não dermos salários dignos e tempo de trabalho digno aos professores e professoras - além de respeito e cuidado - não lhes podemos cobrar o que cobramos. Menos ainda podemos apontar-lhes o dedo!

quarta-feira, 5 de outubro de 2011

VOCAÇÃO PRA SER ROÇA!

A cidade que habito é uma evolução da roça. Será que são assim todas as cidades? O certo é que esta é uma evolução da co-habitação de roças, tanto que sua vocação é ser um espaço moribundo, cemitério de roças. Para todo lado se olha alguém aponta: “ali era a roça de seu Zé de Alguém, a roça de Druby, a roça de Quelequé, a roça do Caralho a Quatro”.

De passagem de vaqueiros, das paragens nas vazantes, embaixo dos juazeiros, foi despontando a cidade, brotando do areal, das lamas dos riachos, das bostas dos bois, das bufas dos cavalos e dos cuspes dos tangedores, donde se ergueram casas e ruas, estreitas e carroçais. Esta cidade tem vocação pra ser roça!

ESCOLA-CAIXA

A escola das minhas filhas é uma caixa. É uma caixa cheia de pessoas e boas intenções pedagógicas, abafadas ali dentro. É uma caixa cheia de ilusões que vibram no acústico da caixa. A ilusão da segurança, da eficiência, do controle, do tempo, do espaço panóptico, contido dentro da caixa. Há gente dentro da caixa, professores, alunos, outros funcionários, e nenhum deles pode ver o céu de dentro da caixa, nem podem ver o rio que desce em seu silêncio aos fundos da caixa. Há sonhos dentro da caixa, uns até são bem novinhos, inocentes, mas todos são infestados desses valores do status, das viagens para a Disney, das festas de aniversários, das poses dos novos ricos, todos tão mal-educados. E não há áreas de escape. No interior da caixa não há por onde vazar. Talvez perto do banheiro, haja ali alguma brecha! O Objetivo da escola das minhas filhas é ser caixa. Quiçá fosse de Pandora, pan-presença, ubíqua, a libertar de sua caixa, seus tantos males e vícios; e a deixar lá, resguardada, a ilusória esperança.

segunda-feira, 3 de outubro de 2011

UM CUTUCÃO DA SAUDADE

Por onde andam seus olhos?
Nos céus azuis do sertão
Pescando estrelas cadentes
No escuro da imensidão

Por onde andam seus dedos?
A constatar espessuras
Outras planícies incertas
Outras tantas aventuras

Para onde aponta seu riso?
De rubis tão reluzentes
Cujo brilho extravagante
Ilumina o ser da gente

Por onde anda, afinal?
Será que virou lembrança,
que só habita a saudade
e não mais dá esperança?